Comunicar em Língua Portuguesa (TPGM - AC)

O presente blog insere-se no contexto do Curso de Técnicas de Produção Gráfica e Multimédia (TPGM) que, actualmente, está a ser ministrado pela empresa Alquimia da Cor, no Porto. O módulo "Comunicar em Língua Portuguesa", inserido no curso de TPGM, está na origem deste blog, que tem como principal objectivo disponibilizar "on line" alguns dos conteúdos incluídos no programa curricular daquela disciplina.

Sunday, November 13, 2005

PUBLICIDADE: UM DISCURSO DE SEDUÇÃO

"A publicidade é talvez uma das linguagens de sedução mais activas e eficazes dos nossos dias. Rendemo-nos a ela mais vezes do que provavelmente suspeitamos. Ela seduz os nossos sentidos e a nossa mente, “acariciando” com as suas mensagens os nossos mais secretos desejos: no ecrã de televisão, nas páginas de revistas, nos cartazes de rua que revemos a toda a hora, somos nós e os nossos devaneios que vemos espelhados.
Falamos de linguagem de sedução e pensamos neste conceito como um conceito alargado que abrange todos os processos psicológicos, ideológicos, sociais, de gestação de sentido na publicidade. (...) Sabemos já que há muito o consumo deixou de significar a aquisição de bens e serviços para satisfação de necessidades primárias. Graças a profundas transformações socioeconómicas, as modernas sociedades desembocaram em sistemas altamente tecnificados, que se estruturam em torno da produção e consumo de mercadorias em escala massiva. A publicidade é, neste contexto, o instrumento que zela pela sobrevivência do sistema, ao assegurar que aquilo que se produz também se consome.
Porém, implantar um bem num mercado saturado de concorrentes obrigou a que a publicidade, aos poucos, fosse envolvendo o consumidor numa complexa teia feita de significado simbólico, que ajuda este último a digirir e a interessar-se pelos objectos em constante aparição. Assim, aproveitando uma necessidade que parece alojada na natureza humana, a de encher de simbologia a interacção do dia-a-dia – no fundo, somos nós que exigimos interpretação simbólica em tudo quanto vemos e conhecemos – a publicidade investiu também os produtos comerciais de sentido social e simbólico. Fê-lo, recriando uma série de representações que, associadas de forma estável aos produtos, permitem a sua individualização e personalização. Fê-lo, por meio da “transfiguração” simbólica e ideológica que os seus poderosos sinais verbais e visuais experimentam no seu processo de significação, acabando por transformar-se em fórmulas de significado social e psicológico inegável.
Originou, desta forma, que as mercadorias sejam usadas simultaneamente como meios de satisfação das necessidades humanas e como comunicadores. Adquirimos um perfume porque apreciamos o seu aroma, mas também porque nos identificamos com todos os outros sinais sociais que a imagética publicitária divulgou. Assim, é a própria linguagem que é objecto de consumo, como afirma Braudillard :” A partir do momento em que a linguagem, em vez de ser veículo de sentido, se carrega de conotações de pertença e se transforma em léxico de grupo, em património de classe ou de casta (...).”
(...) À parte essa poderosa linguagem visual que, de quando em quando, referiremos, a publicidade é também uma linguagem propriamente dita, feita de palavras que seduzem ou devem seduzir, pelas combinações em que se apresentam, pelas desconstruções que praticam, pelos ecos que despertam, pelos implícitos que activam, por uma série de jogos (...). O discurso publicitário é um discurso criativo que vive num desafio de constante inovação. Nós, enquanto espectadores, gostamos de ser seduzidos, mas não a qualquer preço. As boas soluções criativas deixam-nos com a agradável sensação de que aquele emissor oculto detrás do anúncio, pensou em nós e deu o seu melhor para nós. E, quantas vezes, ao deslindarmos o breve gracioso enigma da mensagem, esboçamos um sorriso de aprovação e cumplicidade, que é uma forma de respondermos a esse diálogo implícito em que o emissor nos tentou envolver.
Os anúncios mistificam a nossa existência, mas também nos fazem sorrir, são-nos familiares, colmatam um pouco do nosso isolamento e solidão, despertando em nós impulsos básicos de comunicação, convivência, solidariedade que a vida contemporânea traz esquecidos. Os anúncios fazem-nos sonhar...
(...) As crianças, no seu processo de integração no mundo, repetem-no e “macaqueiam-no” desde cedo; os adolescentes revêem-se nele e (...) assimilam os padrões que ele difunde, adoptam os seus slogans como lemas de vida; os adultos, então! Alguns já bem mais preparados, por vezes nem se distinguem, nem à sua vida, à sua casa, à sua família, das personagens que actua nos “minidramas” que os anúncios montam, E todos, por graça e como que a celebrarmos um ritual de comunhão, cantamos as músicas dos comerciais, aproveitamos os provérbios ou máximas recriadas por eles para a nossa actuação socioverbal, simulamo-nos ocasionalmente os actores desse enorme teatro que é a publicidade e que, no fundo, reflecte, como um espelho íntimo e com lentes de aumentar, a nossa própria vida.
(...) Uma pequena solução textual pode concentrar uma força persuasiva enorme, sendo eficaz na chamada de atenção e no efeito de memorização, duas das etapas mais importantes no processo de comunicação publicitário. Que instrumentos retórico-pragmáticos sustentam a eficácia de certas propostas e que falhas motivam o insucesso de outras? Através da sua reflexão aplicada, a Linguística pode até fornecer esquemas conceptuais que permitam a criação de soluções textuais cada vez mais interessantes e adequadas."

Autora: Alexandra Guedes Pinto, Publicidade: Um Discurso de Sedução

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